segunda-feira, 31 de maio de 2010

Sobre o homem na mesa([1]) Patricia Tenório 28/05/10 primeira edição do curta teatro que aconteceu dia 20/05/2010




Sobre o homem na mesa([1])
Patricia Tenório
28/05/10


No galpão do Espaço Muda pessoas sentadas no chão, tomando o cuidado de deixar o corredor livre: os atores iriam passar por entre nós, no escuro. Tateantes do que aconteceria, ouvíamos o barulho da radiola de vinil no final do disco, e não estávamos mais ali, naquela sala com sofás, cadeiras confortáveis, almofadas no chão. Estávamos agora no imaginário de Pedro Severien que ecoava na voz de um ator no escuro, a partir do instante em que ouvíamos “Ação” e desenrolava em cena uma nova língua.
Um homem deitado sobre a mesa. Não era teatro, não era cinema. Roçava a literatura, com ela se comunicava, mas não nos dava certezas, apenas o desconforto de não nos sabermos onde, por que. Falas desconexas da atriz nos remetem às nossas angústias, outro ator cambaleante nos observa atônito com nossa perplexidade, por não compartilharmos da sua completa desconexão deste mundo, desta Terra que pensamos haver conquistado há milênios, mas que não se importa com a nossa (des)evolução.
Tateantes na vida, tateantes deste sentimento que se quer perfazer em coisa, palpável, tocável, amada ou odiada. Aquilo que desejamos expurgar com todas as forças, ou apenas olhá-lo face a face, mesmo sabendo que somente será no último dia.
O homem na mesa se levanta. Retira do bolso da calça uma arma: aponta para si e para cada um de nós, na esperança que demos uma resposta? Na dúvida se é ele ou o outro o culpado pelo caos? Se é caos ou busca?
Algo perpassa por nós quando sentimos o frio do revólver tocando nosso rosto, causando susto ou riso – um riso nervoso, será? Pois naquele instante, naquele exato momento, passamos de passivos para atores, nossos atos também interferirão no desenrolar do enredo, o cinema se aproxima de nós através do teatro e mais do que na tela grande, mais do que nas páginas folheadas lentamente de um livro, pulsamos juntos e pulsamos muito. Transbordamos arte por todos os poros e o galpão do Espaço Muda é único, somos únicos, o mesmo Ser do princípio dos tempos e para sempre, amém.




Patricia Tenório – Recife - PE, Brasil, 1969.

Seu primeiro livro, O major – eterno é o espírito, recebeu menção honrosa em ficção, em 2005, no Prêmio Literário Cidade do Recife.

As joaninhas não mentem, considerado “uma fábula para o século XXI”, ganhou o prêmio de Melhor Romance Estrangeiro da Accademia Internazionale Il Convívio da Itália em 2008.

Grãos, lançado em Setembro de 2007, recebeu o prêmio Dicéa Ferraz em Poesia e Conto da União Brasileira de Escritores do Rio de Janeiro.

A mulher pela metade (2009) é um romance híbrido, com textos entre a ficção e a realidade, percorrendo várias estradas: da reflexão, da poesia, da filosofia.

Participou juntamente com o fotógrafo Sérgio Pires da exposição Do olhar à palavra (2009), na qual, através de poesias em português e francês, manteve um diálogo com fotografias da França.

Faz parte do conselho editorial da Calibán, uma revista de cultura.

You-Tube: TenorioPatricia


(1) Sobre a adaptação de um cineasta Pedro Severien para o teatro, “O homem na mesa”, primeira apresentação do projeto Curta Teatro, 20/05/10, no Espaço Muda – Recife-PE.

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